O consumo de soja preta é comum na Ásia, onde é consumida como alimento saudável e usada na medicina popular há séculos, sendo rica em proteínas, lipídios, minerais e isoflavonas. No entanto, o que a diferencia são os pigmentos pretos no tegumento da semente, constituídos por polifenóis como antocianidinas e flavonoides, que contribuem para a capacidade antioxidante da soja preta.
Um estudo demonstrou que o consumo de soja preta (35% da dieta), por 10 semanas, em ratas ovariectomizadas, aumentou a atividade antioxidante, inibindo o estresse oxidativo e melhorando os perfis lipídicos, resultando na redução dos fatores de risco associados às doenças cardiovasculares (DCV). Esse artigo pode ser acessado aqui. Outro estudo com cobaiais demonstrou que a administração oral de extrato de soja preta em ratos, a 50 e 100 mg/kg de peso corporal, durante 14 dias, reduziu o risco de DCV ao melhorar a circulação sanguínea através da inibição da agregação plaquetária e de formação de trombos (http://bitly.ws/qz8I).
Alimento funcional e seus benefícios
Os alimentos funcionais são aqueles que, além de nutrir, produzem efeitos benéficos à saúde, em especial na redução do risco de doenças crônicas degenerativas, em especial o diabetes e diversos tipos de câncer. A soja preta é um deles.
Parcela dos benefícios advém de ingredientes com capacidade antioxidante, que têm a capacidade de proteger as células contra os efeitos dos radicais livres produzidos pelo organismo. O antioxidante serve para doar elétrons, seja para os radicais livres ou para células afetadas por eles, reduzindo ou eliminando o estresse oxidativo produzido pelos radicais livres
A função vascular está intimamente relacionada com o risco de DCVs. Um dos fatores de risco, quiçá o mais importante, é o envelhecimento do organismo, que causa alterações funcionais e estruturais da parede vascular. O aumento da rigidez vascular é a principal consequência, e compromete a adaptação vascular às alterações do fluxo sanguíneo e da pressão arterial.
Além do envelhecimento, o estresse oxidativo é outro importante desencadeador de disfunção vascular, até porque ele é potencializado pelo processo de envelhecimento. As pesquisas científicas já demonstraram que a alteração no teor dos óxidos de nitrogênio, como o óxido nítrico (NO), é um evento molecular preponderante para a função vascular, pois a liberação de NO das células endoteliais diminui a concentração de cálcio no interior das células, causando relaxamento do músculo liso vascular, sendo considerado um potencial vasodilatador. Ocorre que tanto o envelhecimento quanto o estresse oxidativo reduzem, significativamente, a produção de NO e podem levar à disfunção vascular.
A disfunção vascular e estímulos lesivos – como o estresse oxidativo – estão intimamente relacionados ao risco de DCV. Aí é que entra a importância dos polifenóis contidos nos alimentos, que atuam redução do risco de sua ocorrência. A soja preta é rica em polifenóis, incluindo isoflavonas, antocianinas, antocianidinas e flavonoides, e seus efeitos preventivos no risco de DCVs foram relatados em diversos experimentos com animais, como relatado anteriormente.
Benefícios para a saúde humana
Também existem estudos científicos conduzidos com populações humanas. Em um dos estudos, realizado na Coreia do Sul, foi relatado que a suplementação de extrato de soja preta (2,5 g / dia), por 8 semanas, diminuiu o acúmulo de gordura visceral e os perfis lipídicos plasmáticos em adultos com excesso de peso (http://bitly.ws/qz8Z). Outra pesquisa foi conduzida pelo grupo da Dra. Yoko Yamashita, da Universidade de Kobe (http://bitly.ws/qz7n). Nesse estudo, os cientistas investigaram o efeito do consumo de soja preta na função vascular e estresse oxidativo, associado às concentrações de polifenóis em mulheres saudáveis. A diminuição da idade vascular foi observada em 33 dos 44 voluntários que completaram o estudo de 8 semanas. Observou-se melhora da rigidez vascular, aumentando o nível de NO2 e NO3 na secreção urinária, e diminuindo os marcadores de estresse oxidativo. Para quem gosta de química, os marcadores utilizados foram 8-hidroxi-2′-desoxiguanosina, hexanoil-lisina e mieloperoxidase.
O estudo também mostrou que a concentração de 12 polifenóis, presentes na soja preta, aumentou no plasma e na urina da população em teste, como função direta do consumo da soja preta. A conclusão do estudo foi que o consumo de soja preta melhorou a função vascular, através do aumento do óxido nítrico e diminuição do estresse oxidativo, acompanhado pelo aumento das concentrações de polifenóis em mulheres saudáveis.
Não por acaso os estudos acima foram realizados na Coreia do Sul e no Japão pois, como mencionamos anteriormente, há um hábito milenar de uso da soja na alimentação humana no Oriente. Razão que também leva a Coreia do Sul a se propor a importar soja preta do Brasil.
Mas, e nós, brasileiros, que desenvolvemos e temos condições de produzir soja preta, não vamos auferir dos benefícios que ela proporciona? É hora de serem elaboradas políticas públicas e campanhas de organizações privadas para que a população do nosso país efetivamente se beneficie de uma nova opção alimentar, nutritiva e com benefícios à saúde.
D. L. Gazzoni Engenheiro Agrônomo, CREA 18.838-PR, pesquisador da Embrapa, membro fundador do Conselho Agro Sustentável e do Comitê Estratégico Soja Brasil.
M. A. Pereira Jr. é médico em Londrina, CRM 10.768-PR.