POR ASSESSORIA
O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) divulgou, nesta quinta-feira (28/4), em parceria com a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) e com o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea/Esalq/USP), nota sobre mercados e preços agropecuários, com uma análise do comportamento dos preços domésticos e internacionais dos principais produtos brasileiros, e os respectivos balanços de oferta e demanda, além das perspectivas do setor para os próximos meses.
Segundo a publicação, o conflito entre Rússia e Ucrânia trouxe um cenário de incertezas sobre a oferta e demanda globais no mercado agrícola. Diante disso, o mercado observou oscilações nos preços internacionais das principais commodities. A nota observa que a Rússia é atualmente a maior produtora mundial de petróleo e gás, e que, nas últimas safras, o país se tornou o maior exportador de trigo do mundo e importante fornecedor de alimentos para a Europa e Ásia. A Ucrânia, por sua vez, é uma das principais fornecedoras de milho e óleo de girassol. Além disso, os dois países têm peso relevante no mercado internacional de insumos agrícolas.
De acordo com a nota, a guerra fez com que grãos e oleaginosas em geral, influenciados pelo trigo e pelo óleo de soja, tivessem altas e atingissem patamares acima dos verificados antes da guerra. Também avalia que problemas climáticos afetaram as safras de grãos na América do Sul, em especial no Brasil, na Argentina e no Paraguai. Esse choque negativo de oferta somou-se à elevação dos custos de produção — devido às altas dos insumos exportados pelos países em guerra.
Para os autores da publicação, as sanções econômicas impostas por diversos países ao mercado russo e algumas quedas na produção em decorrência dos efeitos climáticos podem fazer com que o mercado mundial de commodities agropecuárias vivencie, nos próximos meses, novas altas que podem impactar os preços domésticos.
“As commodities soft, ou seja, aquelas extraídas da natureza, mas que precisam ser cultivadas e não mineradas, como açúcar, café e até mesmo a carne bovina, interromperam a sequência de alta, e apresentaram queda, devido às consequências da guerra sobre a expectativa de crescimento econômico mundial e à sua menor essencialidade em um cenário de conflitos”, afirmou Ana Cecília Kreter, pesquisadora associada do Ipea e uma das coordenadoras da publicação. Porém, ela sinalizou que “como a Rússia e a Ucrânia não têm peso relevante nos mercados dessas commodities, os preços voltaram aos patamares pré-conflito”.
O trigo foi o cereal mais afetado pela guerra no Leste Europeu, uma vez que a Rússia representou 19,3% das exportações mundiais na safra 2020-2021, sendo o segundo maior produtor mundial, atrás apenas da China, em que produção está voltada para atender ao mercado doméstico. A Ucrânia também está entre os principais exportadores deste grão, com participações que variam de 8% a 10% das exportações mundiais. A queda na oferta dos dois países vem impactando os preços internacionais e, mais especificamente, o setor de panificados na Europa. Os preços internacionais do grão romperam as máximas históricas em março, chegando a apresentar cotações 76% acima da média no mês de fevereiro de 2022, antes do início do conflito.
De acordo com Allan Silveira, superintendente de Inteligência e Gestão da Oferta da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), “o primeiro trimestre de 2022 foi importante para a definição da produção de soja e arroz. Para as duas culturas, houve uma redução das estimativas de produção em relação às estimativas de dezembro. Esse fato contribuiu para o aumento da instabilidade dos preços nos mercados de arroz e de soja, dada a redução dos estoques finais esperados para as duas culturas”. Mas complementa falando sobre outro importante grão: “por outro lado, houve uma melhor consolidação em relação à área de milho de 2º safra no Brasil, que deve ter um aumento de 7% em relação à safra 2020-2021. Isso é muito importante, considerando o cenário de conflito na Ucrânia e o ambiente de incerteza sobre a real oferta de milho ucraniano para a próxima safra”.
Um dos produtos que merece destaque é a carne suína, com vendas abaixo do esperado no último trimestre de 2021, que fizeram com que o setor registrasse, no início de 2022, elevados estoques de carne e de animais e que contribuíram para a queda nos preços domésticos. Além da alta oferta, o início do ano verifica, historicamente, menor volume de vendas. Somado a isso, a queda nas exportações de carne entre janeiro e fevereiro também reforçou o aumento da oferta doméstica.
No caso da carne bovina, a baixa oferta de animais para o abate e o desempenho recorde das exportações da proteína, especialmente para a China, elevaram o preço doméstico da carne. A demanda internacional segue aquecida devido ao avanço das importações chinesas.
Segundo Nicole Rennó, pesquisadora da área de Macroeconomia do Cepea, “os preços agropecuários se mantiveram em patamares expressivamente elevados no primeiro trimestre de 2022, um reflexo das sucessivas altas verificadas a partir de 2020, com a situação agravada recentemente pela guerra entre Rússia e Ucrânia”. Ela traça um panorama para o setor: “para os próximos meses, ainda há grande indefinição, mas as condições de oferta e demanda e o cenário macroeconômico, em geral, apontam para a manutenção de patamares elevados para os preços. O comportamento da taxa de câmbio, a velocidade de reação da demanda doméstica e os efeitos da guerra serão determinantes para os ajustes positivos ou negativos nos preços dos diferentes mercados nos próximos meses”.